Também estive pensando na minha avó.

Meu avô já se foi.
Minha avó está internada - nada grave.
Talvez em breve seja.

Reencontrei um poema que escrevi pra ela,
lá longe, noutro eu.
O mesmo eu.
Só que outro.

Narrava.

Mais novo - mais ingênuo?
Mais solto.

Semana passada disse que ia lá.
Talvez tenha dito.
Devo ter dito.
Se não disse, é porque é o tipo de coisa que eu diria.

Hoje disse à minha mulher que vou.
Visitar minha avó.

E nessa dor descubro-me:
o eu de agora,
o eu de antes,
e o de amanhã.

O fim da partida não trouxe alívio. Só um tipo diferente de silêncio. A luz da tela se apagando, os dedos ainda tensos, o corpo meio encurvado. Levantei sem pressa. Peguei a chave, fechei a porta, e fui. Não havia urgência. Mas havia direção.

No caminho, o mundo passava ao redor. Sem pressa. Sem ruído. Era como se eu flutuasse entre faixas e faróis, presente e ausente ao mesmo tempo. Pensava. Não por querer pensar, mas porque o pensamento acontecia - solto, inevitável. Sobre escolhas. Sobre as curvas que a gente faz antes mesmo de perceber que fez. Sobre os outros carros, outras vidas, outras rotas. Ninguém ali por acaso. Nenhum destino sem dedo.

Cheguei. Entrei sem dizer nada. Ele já sabia. Um gesto de cabeça. Um nome que nem precisei falar. Estava dado. Como se eu fosse um hábito. Como se já estivesse escrito, desde a primeira vez. Era um roteiro que eu reconhecia sem ter assinado.

E naquele instante, sem nada de especial, entendi: as escolhas levam. Levam mesmo quando a gente acha que está parado. Mesmo quando tudo parece igual ao ontem. Levam pela repetição. Pelo gesto pequeno. Pela ausência de surpresa.

E é ali que mora o risco: não o de bater, não o de errar o caminho, mas o de esquecer que é escolha. Até o automático é escolha.

As escolhas levam. E eu fui.


Após a guerra atômica finda -
que sequer houve, senão em campo pixelado -
resta-me o silêncio do motor,
a rua deserta de sentido,
o retrovisor cheio de vidas que não escolhi.

Pensava -
num lampejo entre a marcha e o piscar dos faróis -
sobre como tudo pulsa em condição.
Probabilidades, sim. Mas não livres.
Condicionadas à curva da vontade,
ao leve torcer do volante,
ao simples desejar do querer.

E ali,
houve um saber prévio.
Mirando o gesto antes que fosse.
"Souza Paiol, né irmão?"
Nem cheguei - e já sabiam.
Antes do passo, o trilho.

Porque o caminho que se trilha é o mesmo que se repete,
e o mundo, este espelho de frequências,
não responde às perguntas que não se ousa fazer.
Ele apenas antecipa.

E eu, que ali estava, já havia sido.
Já havia ido.
Levado pelo fio tênue do hábito,
pelo rito calado da decisão não decidida,
pelo pulsar de uma vida que pulsa por padrão,
não por escolha.

Mas ainda que repetido, o gesto carrega o abismo:
cada escolha é o precipício do possível.
Cada direção, um abandono.

Na fumaça do cigarro,
há o traço invisível da encruzilhada.
Sou o ponto onde convergem os vetores.
E o ponto, ínfimo e constante,
decide a linha.
Ainda que não saiba.

Porque as escolhas levam.
E o que nos leva - é sempre o que escolhemos.
Mesmo quando não o escolhemos.

Começou com um susto. Dessa vez não perdi meu norte. Fiquei satisfeito de você ter dado uma satisfação, você não me dava muitas. Sem drama, sem cobrança também. Senti que peguei pesado com você. Senti que não sulbi terminar nosso sei lá o que. Namoro? Se não era, era quase. Talvez até fosse. O final seria o mesmo. Separação. Por mim, até logo. Por você, definitivamente adeus. Tchau então. Do seu lado encontrei um rumo. Rumei sozinho. Sozinho com você do lado. Loucura, né? É. Nosso relacionamento foi assim. Não remado. Capotante. E eu adorava. Adorava deitar do seu lado e ir caindo da cama. Adorava colocar o pé no freio sendo que eu estava na carona. Quase ia bater. "Mano, ainda tem um espação." Não teve. Bateu. Batemos. Bati. De cara com a minha insegurança. E meus medos. Você é bacana. Feito uma louca. Na sua imaturidade conheci uma pessoa que me apaixonei pela maturidade, princesa. Princesa. Que sonhava com um conto de fadas e acabou numa novela mexicana? Sem direito nem à um adeus decente. Achei que não merecia, ou achei que não precisava? Não importa. O desenrolar foi esse. Não te dei valor, sendo que você tem. Te magoei, sendo que você não merecia. Fiz cagada. Fiz cagada e na real eu queria era te agradecer. Você se importou comigo. Você me deu valor. Bem injusto. Eu hoje não estou pronto pra você. Obrigado pelos sorrisos. Obrigado pelos abraços quentinhos. Obrigado pela preocupação de querer me ver bem. Estou bem. Remando e remando. Dessa vez sem capotar espero. Estou dando um retoque no acabamento. A estrutura continua frágil. Mas pareço bacana. Quem sabe não vinga? Você é especial. {φ, τ, princesa}.  Por todos meus defeitos descritos em uma lista com >30 itens, não me desculpo. Magoou um pouco, não vou mentir. O que foi escrito, escrito foi. Nem as lagrimas, nem uma bucha apagam. Seja na parede, seja no papel. Vai continuar aqui escrito que você me ama, igual outras já amaram. Por você tenho admiração e respeito. Carinho. Fico satisfeito que você está tranquila. As idéias fluem num ritmo que não consigo mais acompanhar o pulso. Por você eu pulso e você me faz pulsar. Coração mesmo. Meio arrítimico. Não chega a ser patológico. Mas era preocupante, a decisão foi preventiva. Por você me derreti e acabei te dando um gelo. Amargo. Nada doce. Doce foi a sobremesa. Outro dia fui vê-la novamente. Pra minha surpresa o conteúdo estava bloqueado. Não entendi. Perguntei. Continuei não entendendo. Agora entendo. Não vou te esquecer. E não vou te apagar da minha parede. Você não é passado. Relacionamentos não ficam no museu. Tampouco num outdoor. Se é necessário o anúncio, não deve estar vendendo bem. Anuncio agora, saudade. Porque você não ta comprando. "EXTRA, EXTRA!". Eu te amo. Te amo nas curvas escuras de uma estrada de terra. Amo suas curvas. Amo os excessos. Os meu de velocidade. Os seus de ciúme. Os nossos de planejar. Até desenhamos, lembra? Uma casínea. Agora enxarcada. E nem tem problemas na tubulação. O problema deriva das janelas - da alma - abertas. Já fechei. Uma hora seca e torna a ser habitável. Mesmo com condições talvez nunca seja. Os prováveis moradores não concordam em alguns termos do contrato. Uma acha, inclusive que nem reformas sustentariam tal edificação. O outro acredita que o alicerce, mesmo com uma fundação meia boca, aguenta o tranco. Divaguei. Devagar. Com calma. Já é tarde. Obrigado por tentar. E insistir. Insisto no até logo. Por enquanto, adeus.

Minha avó, outro dia, quando estávamos conversando na mesa do café, depois de eu ter falado mais uma vez pro meu avô que ele não precisava guardar tanta tralha, soltou "sem querer":
- Só de computador tem seis. Um estava até quebrado, joguei fora.
Ele, assustado, indagou:
- Jogou fora, Zula!? Não pode...
- Todo quebrado. Joguei na caçamba.
- É meu computador, Zula. Eu que decido se é ou não pra jogar fora.
- A caçamba ainda tá lá fora...
Dona Zula, com um humor inglês que eu ainda não havia presenciado, completou rindo litros:
- ...vai lá ver se ainda ta lá!
Rimos todos - exceto seu Vantoir. 
- Isso não se faz, Zula! (bravo)

Luis,
o Impossível.
- herói das probabilidades -
"gente, como é possíbel?"
o acaso, conquanto, desenrola-se
desta forma
na melhor das intenções
- E de boa vontade!
colabora com o coração
sem êxito, todavia
explica-se
"mas eu só queria ayudar!"


Chego ao meio-dia.
Você sabe - é depois.
Mas acredite: meio-dia, aí estou.
Faz macarrão, vó?

Vó,
Você me entende.
Me conhece nessas palavras
sem pretensão dialética.
Só eu - no seu colo.
Você - no meu coração.

Vó, vou na semana que vem.
Chego pro jantar.
Amanhã, tomamos sorvete.

Vó, volto na próxima semana.
Chego ao almoço.
Espero o cardápio:
abraço da vó.

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